A demanda pelo comércio eletrônico, que já manifestava um forte crescimento nos últimos anos, vem apresentando taxas de crescimento ainda maiores em decorrência da quarentena e da nova realidade do mundo pós covid-19.

As empresas que operam a logística para e-commerce têm enfrentado grandes desafios tanto em seu planejamento estratégico quanto para colocar o que foi planejado em prática, no nível operacional do dia a dia.

O planejamento logístico estratégico (desenho de malha) dessas operações consiste em identificar a localização ideal das instalações, seus tamanhos, capacidades, quantidades e tipos de recursos (sorters, balanças, máquinas etiquetadoras e docas de recebimento, por exemplo).

Além disso, ele também deve identificar como os fluxos de distribuição devem ocorrer para transportar a carga desde seu ponto de origem (o seller) até o cliente final, passando por todas as rotas de abastecimento ao longo da cadeia logística.

Nesse artigo vou explorar as peculiaridades desse tipo de estudo, mostrando as principais diferenças do desenho de malha de operações de e-commerce para o processo de desenho de malha ”convencional”, que ocorre tipicamente em operações logísticas de embarcadores, como indústrias e empresas de varejo físico.

Embora as principais tomadas de decisão desses dois tipos de estudos sejam da mesma natureza (a localização de instalações e definição de fluxos de transporte), as operações de logística para e-commerce têm muitas peculiaridades e devem ser tratadas como um problema de localização de redes HUB-and-Spoke (chamarei nesse artigo de ”problemas de HUB”, uma vez que a estratégia básica é utilizar HUBs de consolidação).

Peculiaridades dos problemas de HUB

O problema de HUB não trata apenas de operações de logística para e-commerce: de maneira geral, esse problema está associado a operações que precisam atender demandas de transporte de carga parcelada (que é o caso do e-commerce, onde temos diversos tipos de mercadorias em um único veículo), ou ainda, associado ao transporte de pessoas (no caso de companhias aéreas, por exemplo).

O quadro abaixo mostra de forma sistematizada as principais diferenças associadas aos dois tipos de problema:

Figura 1 – Quadro comparativo entre os problemas de HUB e os problemas convencionais

Comportamento da demanda

A principal razão da diferença entre os problemas de HUB e os problemas de desenho de malha convencionais é a maneira como a demanda de transporte é fornecida: enquanto no problema de HUB se busca atender demandas de transporte, com inícios e fins pré-definidos (para cada pacote, já se sabe qual é seu ponto de origem e de seu destino final); no problema de desenho de malha convencional é necessário atender demandas de abastecimento associadas a cada cliente e produto, mas é possível decidir qual é a origem de cada produto (onde deve ser produzido cada produto, por exemplo).

Usarei um exemplo ilustrativo para destacar essas diferenças. A Figura 2 mostra as formas de representar demandas de cada um dos problemas. O mapa da esquerda mostra a demanda de um problema de desenho de malha convencional, com 42 pontos espalhados pelo Brasil.

Já a demanda de um problema de HUB equivalente, com os mesmos 42 pontos, pode ter mais de 1.700 demandas de transporte diferentes (representadas pelas linhas do mapa à direita).

Figura 2 – Demanda do problema de desenho de malha convencional (esq.) e demanda do problema de HUB (dir.)

Para ambos os problemas, um conjunto de candidatos a instalações logísticas deve ser definido, sejam elas centros de distribuição ou HUBs de consolidação. Neste exemplo utilizei o mesmo conjunto de candidatos, que é composto por doze das principais cidades com demanda (Figura 3).

Figura 3 – Candidatos a instalação de ambos os problemas

Estratégia de redução de custos

Outra diferença fundamental está relacionada às estratégias de redução de custos que os algoritmos utilizam para identificar as melhores soluções de cada problema.

A ideia básica do desenho de malha convencional é equilibrar os custos de transporte e os custos fixos de instalação, para obter a quantidade ideal de instalações, como podemos ver na Figura 4.

Figura 4 – Equilíbrio entre os custos de transporte e de instalação

Além disso, a localização de cada instalação, estrategicamente posicionada em relação à demanda e aos fornecedores (Figura 5) permite minimizar as distâncias de transporte, e por consequência, seus custos. Repare que nesse tipo de solução, toda a rede logística não está necessariamente conectada, uma vez que é possível descentralizar a produção e o estoque de mercadorias.

Figura 5 – Solução do problema de desenho de malha convencional, obtida pelo FOCS

A estratégia utilizada para resolver o problema de logística para e-commerce, por outro lado, se baseia em consolidar diversas mercadorias em um mesmo veículo; essa consolidação é feita justamente por meio de instalações denominadas HUBs de consolidação.

Os fluxos de transporte entre os HUBs (linha azul da Figura 6) normalmente ocorrem com veículos maiores (carretas, por exemplo) que apresentam ganhos de escala, uma vez que quanto maior o veículo utilizado, menor é o custo unitário de transporte. Nesse tipo de problema, a necessidade de transporte já está associada à demanda e por isso toda a rede de transporte é necessariamente interconectada.

Consequentemente, a ideia geral desse tipo de problema é identificar locais estratégicos de HUBs que consolidam a carga de origem e destino e se conectam entre si, permitindo que as viagens mais longas sejam percorridas pelos veículos maiores, de menor custo unitário.

Além disso, também é necessário identificar os locais ideais para pontos intermediários de cross-docking, que são abastecidos e abastecem os HUBs; esses pontos também são utilizados como base a partir de onde as rotas de coleta e de last-mile partem.

Figura 6 – Solução do problema de HUB, obtida pelo FOCS.HUB

Modelagem matemática

Do ponto de vista matemático, embora os dois problemas sejam difíceis de serem resolvidos, o problema de HUB costuma ser muito mais desafiador. O primeiro motivo é que os problemas de logística para e-commerce costumam ser maiores (em função do tipo de demanda, associado a cada par Origem→Destino), conforme vimos na Figura 2.

Mas, além disso, mesmo se compararmos dois problemas (um de cada tipo) com as mesmas demandas de transporte e de candidatos, a quantidade de possibilidades existentes para a resolução do problema de HUBs será muito maior.

Isso acontece porque enquanto o problema de desenho de malha convencional tem que encontrar apenas como abastecer cada cliente, o problema de HUB tem que definir o caminho completo de cada uma das mercadorias; e esse caminho pode ser feito de uma infinidade de maneiras diferentes.

Em função dessa complexidade matemática, que é maior para os problemas de HUB, os algoritmos tipicamente utilizados para resolver problemas de desenho de malha convencionais (modelos de otimização exatos) não são capazes de resolver os problemas de HUB.

Consequentemente a abordagem necessária para solucionar esses problemas é utilizar ferramentas híbridas, que combinam os modelos mais clássicos de otimização com heurísticas e modelos de inteligência artificial para encontrar soluções de menor custo que atendam os rígidos níveis de serviço definidos.

Essa mesma questão foi assunto de uma pesquisa realizada por Cunha e Silva (2005), que desenvolveram métodos que utilizam heurísticas populacionais (em que se trabalha simultaneamente com inúmeras soluções, que são combinadas para gerar novas soluções de qualidade) para a resolução do problema.

A pesquisa se destaca pelo fato de considerar economias de escala nos transportes, que, conforme já foi dito, é um dos principais mecanismos utilizados para a redução de custos de operações de logística para e-commerce.

O mesmo princípio da pesquisa é considerado no FOCS.HUB, que ainda vai além: os veículos que devem ser utilizados em cada um dos trechos de transporte, desde a coleta, passando pela transferência entre HUBs, até o last-mile, são definidos pela ferramenta, e os custos unitários associados a cada veículo.

Comentários finais

Para finalizar, também é necessário destacar algumas peculiaridades dos problemas de HUBs que o tornam mais complexos: tipicamente este tipo de operação lida com pontos de demanda (tanto entrega quanto coleta) geograficamente difusas, com drop-sizes relativamente baixos.

Esses fatores podem impactar significativamente nos custos de transporte, principalmente no last-mile; dessa forma, durante o planejamento estratégico da malha logística para e-commerce, costuma-se também considerar decisões do nível tático, tais como a frota necessária para cada parte da operação.

São por todos esses motivos que não podemos lidar com o desenho de malha para e-commerce da mesma forma como lidamos com o desenho de malha de cadeias de distribuição “convencionais”.

Não se pode simplesmente utilizar as ferramentas de prateleira que estão no mercado, uma vez que a grande maioria não está preparada pra resolver os problemas “não convencionais”, como o problema de HUB.

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